CHARQUE
Para
Luis Eurico de Melo Neto,
Ainda poderei usar aquelas palavras?
As mesmas que ontem formavam corpos
De ruminantes bovinos
Em currais de satisfeita esperança?
Eram lerdas, mas gratas, anchas,
Como se o sentido do mundo
Se lhes escorregasse, suave massa,
Pela garganta.
No entanto, foram sangradas, escalpeladas,
Cortadas em postas finas
Para secas mantas:
Assim expostas, conservavam por instantes
Um rubor úmido,
Embebidas, em parte, no próprio sumo
Extraído em meio à tradicional carnificina.
De si mesmas lavadas,
Jazem agora sob ávidas camadas de sal,
O sal em cristais, sedento e frio vampiro.
Ainda poderei usar estas palavras
Em decomposição adiada?
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Danúbio Gonçalves, Xarqueada, Xilogravura, 1952 |
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