Para Luis Eurico de Melo Neto,
Ainda poderei usar aquelas palavras?
As mesmas que ontem formavam corpos
De ruminantes bovinos
Em currais de satisfeita esperança?
Eram lerdas, mas gratas, anchas,
Como se o sentido do mundo
Se lhes escorregasse, suave massa,
Pela garganta.
No entanto, foram sangradas, escalpeladas,
Cortadas em postas finas
Para secas mantas:
Assim expostas, conservavam por instantes
Um rubor úmido,
Embebidas, em parte, no próprio sumo
Extraído em meio à tradicional carnificina.
De si mesmas lavadas,
Jazem agora sob ávidas camadas de sal,
O sal em cristais, sedento e frio vampiro.
Ainda poderei usar estas palavras
Em decomposição adiada?
Danúbio Gonçalves, Xarqueada, Xilogravura, 1952 |
Sobre Danúbio Gonçalves: Aqui ou Aqui
4 comentários:
Oi,
acho que é essa é a mesma minha "Ladainha"... O poder do poeta reside em reavivá-las (as palavras). Tens o poder.
Um abraço
Já havia lido o Eurico e agora te leio. Inquietei-me lá, inquieto-me aqui. Eu ou o animal que ainda mora dentro de mim? Não sei...
Excelente, Marcantonio. Parece magia o que você faz com as palavras.
Beijos,
Pelo amor de Dio!
Engasgo-me ao manducar essa CHARQUE...
Bem feito.
Hoje mesmo repeti o mesmo ritual com a marmita.
Mas, que bela dissecação, amigo.
Um trabalho estético que se aproxima dos anatomista ou dos melhores magarefes.
Grato.
Abraço fraterno, Poeta.
maravilha, a lírica do Eurico merece essa representação, poetas lado alado
abraço
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