O sol se põe.
A fraca luz aplaina os teus relevos.
E prosseguir sob a luz da lâmpada
Seria como passar à tonalidade
De sol menor,
Ou recordar a manhã
Com palavras entardecidas:
Não poderia confiar na fidelidade
Dos matizes que tênues mudam
De temperatura.
É um fato magnífico que as cores
Anoiteçam e amanheçam,
E é tão correspondente aos ciclos
De auroras e crepúsculos que temos
Na alma e no corpo.
Correto seria dizeres:
“Meus cabelos castanhos-anoitecendo”
Ou “minha pele está rosa-amanhecer”.
Pois
As cores têm horários, graus de lucidez,
E não posso unir horas distantes
No teu retrato. Aguardemos.
Mas se fora de outro tipo a minha arte,
Amasse o mármore ou a argila,
Fosse eu um escultor,
Poderia no escuro ver com meus dedos
A temperatura da tua pele e a essência
Incolor da tua face,
E assim transferi-las à matéria diversa.
Porém, desse modo,
Talvez nos sentíssemos mais tentados
A deixar inacabado o teu retrato.
Vênus de Colona, cópia da Afrodite de Cnido |
9 comentários:
Tem razão, poeta. Não há como representar o tom limpo-acordar da musa. Será obra eternamente incabada. Abração.
Seu poema tem tato, vi uma escultura surgir aos meus olhos.
Genial!
Final? Evito lamentar, embora fique tentada. Mas registro que com a palavra você é pintor, escultor...enfim, trabalha o mármore, a argila, as cores... com a palavra você foi e vai sempre além de todos os sentidos. Um poeta, dos melhores que já pude ler nos últimos tempos. E aguardo a nova alvorada do artista.
Beijos,
Tânia
E nos meus olhos fez-se retratos desenhados por ti!^^
Estamos em contínua transformação. Nunca somos os mesmos. Daí,como traçar um retrato? Mais feliz a poesia, que deixa aberta a imaginação para recriar as imagens que quiser.
bj e um bom carnaval.
essa perfeição suposta efêmera
eterniza-se
...
Mágico!
forte abraço,
irmão.
marco,
que desfecho lírico primoroso para a tua preciosa série de retratos!
bravo!!!!
como era de esperar, fechou com chave de ouro...
impecável!
...há muito que defendo a ideia, Marco, que existimos o que somos - apenas e tão só o que somos - seja pelo que escrevemos, seja pelo que esboçamos, ou seja pelo que omitimos através da escrita, pensamento ou esboço. Desta maneira, nós - os humanos - na tinta ou no talhe, ou na ausência disso, muito demonstramos o que realmente somos.
Eu te agradeço, novamente, este montão de sensibilidade que tu colocas à disposição da humanidade (esta desmedida grandeza em escalas-escadas de cores), isto tudo, pra mim, é equivalente a muito tempo, muita vida.
Neste exato momento, leio-te em frente ao mar e, com tua permissão, eu salvei pra ler-e-reler muitas vezes, um presente.
:)abração pra ti
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